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terça-feira, 8 de agosto de 2023

Gatilhos, de onde vem e para onde vão..

Gostaria de compreender o mecanismo de gatilhos de algumas memórias que tenho, que nos momentos mais "nada haver" elas pairam nos meus pensamentos e ficam ali rodopiando como folhas em um espiral de vento, todas rindo de mim sussurrando e soprando carinhosas lembranças.

Estava almoçando e pá, veio a lembrança de um agasalho do meu irmão,  era marrom com golas e punhos pretos e na frente a estampa de três dados coloridos empilhados. A lembrança do meu irmão vestindo ele para ir para a escola, a lembrança do agasalho guardado no guarda roupas, quando ja nao servia mais a ele. Com uns 13 anos eu peguei ele e me chamei de dona, porém ele já não parecia mais tão bonito como eu o via.

Eu doei ele e quem ganhou fez tão bom uso, que de todas as lembranças que vieram hoje, essa foi a que mais me sensibilizou.

Nessa época, eu tive um colega, amigo, ele era muito pobre, mas muito mesmo, a ponto de ir de chinelos de dedo no inverno, e quem é do Rio Grande do Sul, ainda mais da cidade que nasci, tem uma leve noção do rigor do frio. Eu lembro de olhar para os pes dele, cruzados embaixo da carteira, das roupas pequenas e curtas, ele parecia estar com muito frio.

Ele era um dos mais inteligentes e esforçados, foi o único ano que estudamos juntos, ele era miúdo, um dos menores da sala, sempre muito soŕridente. Entre amigos nos reunimos e cada um doou uma coisa: tenis, meias, touca e eu o agasalho.

Colocamos em uma sacola, em baixo da carteira junto com os materiais e eu escrevi o bilhete, não lembro mais o que escrevi, mas como eu era a mais intima, escrevi com carinho, para nao constrangelo, como se eu tivesse dando todas as peças. Lembro dele lendo o papel, olhando para os lados, o sorriso e um obrigado dito em voz sussurrada.

No outro e nos demais dias, eu vi ele com aquele agasalho e novamente todos os demais dias, criando novas e novas lembranças.  Ainda estou pensando aqui o que me levou a essa enchurrada de pensamentos, talvez ontem por ter conversado com meu irmão e ele mesmo envelhecendo eu ainda o vejo como aquele carinha de moletom saindo para estudar.

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