Beatriz era o nome dela. Se fechar os olhos, consigo lembrar da voz, a forma como ela olhava, sentava e as roupas que costumava usar. O lugar também não escapa a minha lembrança, as cortinas, a estampa do sofá, a mesinha de descanso. A sala de espera, com o quadro de uma bailarina que tantas vezes tentei reproduzir em meus desenhos.
Ela foi minha primeira psicóloga e com ela passei as tardes de terças e quintas, durante alguns anos.
Ontem afirmei que não gostava dela, mas pensando melhor, como criança eu não tinha essa percepção de gostar ou não dela e nem de ninguém. Na verdade eu até simpatizava com ela que me parecia com a Vera Fisher, achava ela linda, muito calma, segura, silenciosa. Não lembro se ela sorria ou se a memoria me engana.
Tirando o fato de eu não gostar de ir até o consultório , era um tempo que eu deixava de brincar e mais tarde, era uma tarde a menos com meus amigos. Além do horário, que era sempre as 15 horas, bem no meio da tarde, não podia fazer nada antes e depois já era muito tarde.
Eu gostava de estar lá, gostava (ainda amo) os vínculos de amizade e intimidade que nasceram naquele consultório. Iniciei com ela com terapia individual, ela me observava desenhar, depois brincar e por ultimo me juntou a um grupo de crianças. Nos éramos diferentes entre si, pouca variedade de idade, escolas e bairros diferentes e motivações diferentes em estar ali.
Brincávamos, desenhávamos, brigávamos e consolidávamos amizades.
Com a idade, a terapia continuou em grupo, porem a gente não sentava mais para brincar, nos disputávamos que sentaria no único sofá que havia na frente dela, os demais se conformavam com as cadeiras nos próximos 45 min, nossa regra era sempre quem chegava mais cedo para a consulta e passamos cada vez a chegar mais cedo.
A sala de espera estava pequena pra nos, queríamos mais.. a escada do prédio, olhar a cidade pela grande janela de vidro era nosso ponto de encontro e com ela nos chamando pela porta que já estava na hora..
Guardo recordações boas desse tempo, não só dos vínculos formados, mas dela também.. que me fez entender que todos nos temos nossa individualidade e que eu não podia me sentir diminuída ou envergonhada com meu problema e que cada um que estava ali também buscavam a sua recuperação.
Incentivar a minha fala, sempre foi o seu objetivo, ela me questionava, hoje vejo como tentativas em me tirar da zona de conforto. Entender o por que aquela criança reprimia os pensamentos, ao certo ela conseguiu, pois o "problema" ..aquele lá, foi resolvido.
E chegou um tempo que as sessões já não eram mais em grupo, ficamos apenas dois e nosso bem querer ia além daquela sala. Foi quando desistimos, por que estar com ela, não fazia mais sentido sem um estar com o outro.
A gente cresceu...
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